6- Sobre o karaokê

por | out 25, 2018 | Amor | 1 Comentário

Era o terceiro ou quarto encontro de Isabela e Catarina. Nenhuma das duas se lembrava exatamente, mas esses mesmos três ou quatro encontros já eram suficientes para que soubessem um pouco sobre as preferências uma da outra. Isabela sabia que Catarina era apaixonada por vinho, louca por música e a melhor companhia para jantar. Catarina já sabia que Isabela preferia drinks doces aos amargos, que não podia comer queijo e que era apaixonada por filmes ruins. Nesse terceiro ou quarto encontro, Catarina levou Isabela para um tradicional bar da cidade. Ele tinha nome de um famoso cantor americano e seu cardápio era uma obra de arte à parte – tal qual seus drinks.

“Olha, esse veio com um biscoito da sorte!”, Isabela disse assim que seu drink chegou. Ele tinha espuma de manga e alguma outra combinação que o deixava levemente amargo, mas ainda delicioso. “O riso é a menor distância entre duas pessoas”, ela leu o bilhete do seu biscoito. Sorriu para Catarina, que retribuiu. “Viu?”, ela brincou.

Ela deu um beijo em seu rosto, fazendo com que ela sorrisse de novo, automaticamente.

“Experimenta o meu. Tá bem forte”, ela disse, colocando sua bebida na frente da garota, que fez uma leve careta ao provar.

“Nossa, tá mesmo. Mais três goles desse e eu já fico alegre”, ela disse rindo, enquanto voltava a beber seu drink e praticamente previa o que aconteceria em menos de duas horas.

Catarina e Isabela tinham o mesmo tom de voz e a mesma timidez disfarçada. Catarina era sete anos mais velha que Isabela, mas ainda tinha um ar de menina levada. Talvez fossem pelas meias coloridas e estampadas que apareciam quase-sem-querer sob a calça jeans. Isabela, apesar de mais nova, tinha uma alma talvez mais velha que a de Catarina. E, de alguma forma, combinavam. Na profissão que dividiam, nos gostos por canais de comédia e na escolha de estampas de camisetas divertidas. Ainda era o terceiro ou quarto encontro, mas já se gostavam.

Mais que isso: gostavam de estar juntas e de suas respectivas companhias.

“Eu não acredito que você também estava nesse show. Eu fui sozinha!”

Isabela perguntou surpresa, já em seu terceiro drink e com um sorriso um pouco mais exagerado que o normal. O batom vinho já estava levemente borrado no canto dos lábios dela – não por causa de um beijo, que ainda era aguardado, mas pelas vezes em que eles dançaram na borda da taça de cristal.

Elas falavam sobre uma banda de post punk islandesa que tinha feito um show recentemente na cidade.

“Nossa, sim! E eu fiquei no fundo, perto do camarote…”, Catarina disse rindo, também. Ela não tinha o semblante bêbado que Isabela começava a criar, mas estava visivelmente feliz, também.

“Meu Deus, eu também! Estávamos muito perto!” ela concluiu, surpresa.

Isabela sorriu ainda mais – como se fosse possível

“É sério?” perguntou animada.

Ela retribuiu a animação.

“Sim, é sério. Vamos?” repetiu.

“Sim, vamos, sim sim sim!” Isabela virou o restante de sua bebida, Catarina pediu a conta e saíram quase que correndo do bar.

O karaokê ficava em outra parte da cidade e, mesmo sendo quase meia noite, isso não serviu de empecilho para mudar o plano traçado de último segundo. As duas estavam animadas demais, bêbadas demais e envolvidas demais para querer que a noite terminasse. Era apenas o terceiro ou quarto encontro, mas já dividiam algo.

Dividiam a vontade de descobrir a noite. Dividiam a sintonia. 

Chegaram no karaokê e pediram a primeira música. O lugar estava cheio de grupos de amigos e não tinha muitos casais por ali. Isabela até se sentiu um pouco tímida com essa constatação, mas Catarina ignorou completamente o fato e pegou o microfone.

“Vamos cantar Marisa Monte?”, ela perguntou rindo.

Isabela adorou a sugestão e fez que sim com a cabeça.

As primeiras notas de “Não Vá Embora” começaram e as duas, rindo alto, começaram a cantar, juntas, a música escolhida, que talvez de um forma não-coincidente, narrava o que as duas sentiam. As luzes coloridas do ambiente se misturavam aos cenários aleatórios que apareciam na tela do karaokê e Isabela poderia lembrar de todo aquele cenário para sempre.

As luzes, as fitas no teto, os tons de cor-de-rosa e azul do vestido da menina que as assistia. Catarina cantava firme, mas com muito mais desenvoltura que Isabela, que ainda assimilava tudo o que estava acontecendo naquele encontro.

Elas tinham chegado naquele momento dos bons encontros que se tornam inesquecíveis.

E Isabela sorriu ao perceber isso.

No decorrer da noite, cantaram Everytime. E Total Eclipse of The Heart. E Bring Me To Life, que outro casal estava cantando, mas que elas gritaram tão alto quanto os verdadeiros cantores. Se divertiram como há tempos não divertiam. Isabela, principalmente.

“Você tá se divertindo?”, Catarina perguntou, enquanto olhava no fundo dos olhos dela que, a essa altura, já estavam semicerrados por conta do horário e da bebida.

“Muito. Mesmo”, ela disse pausadamente, antes de dar um beijo na interlocutora.

E ao som de Backstreet Boys, dividindo uma cadeira de tecido vermelho, com cerveja derrubada no chão e sapatos grudando, Isabela percebeu que, naquela noite, estava apaixonada. Por Catarina, pela franja curtinha que estava grudada em sua testa, por seu vestido de guaxinins e pelo jeito com que cantava. Mais que isso. Estava apaixonada pelo jeito com que ela a olhava.

Ela não sabia se o amor perduraria até a próxima manhã. 

Mas, naquele momento, aquele amor, 

ele era o maior do mundo.

Leia os outros posts da série “Amores eternos de um dia“:

#1- SOBRE O LENÇOL AZUL-MARINHO
#2 – BUDAPESTE
#3 – A FLOR, A FITA, O SORRISO E O PARQUE
#4 – RAIO, ESTRELA E LUAR
#5- BUENOS AIRES, O TINDER, O PLANETERÁRIO E O MENU CELÍACO

 

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