A neura dos 30

por | maio 2, 2022 | Pessoal | 0 Comentários

Poucas coisas são tão ilusórias e românticas quanto a ideia de que, aos 30, seremos adultas com todas as respostas para as grandes dúvidas do universo. Eu tenho várias cartas escritas para a Michele de 30 anos e, em todas elas, eu falo as mesmas coisas. Elas se baseiam, basicamente em 3 tópicos: carreira, amor e maturidade. Aos 15, imaginava que aos 30 eu já seria casada, mãe e executiva de alguma empresa. Aos 17, achava que viveria algo como O Diabo Veste Prada, ou seja, uma carreira de jornalista de moda com acesso livre às botas Chanel que a Anne Hathaway usa no filme. Aos 20, um pouquinho menos romântica, era mais direta: trabalharei na minha área e terei um relacionamento estável, feliz e duradouro. 

Eu tinha certeza que minha vida seria assim kkkk

Uma das coisas mais fofas (e eu uso a palavra “fofa” de forma proposital) dos 20 é que realmente acreditamos em respostas simples, como se a vida fosse um questionário de vestiblar com 3 respostas erradas e uma única alternativa correta. Mas isso a gente só aprende quando chegamos nos 30. Se você, assim como eu, também nasceu no comecinho dos anos 90, provavelmente viveu o mesmo movimento cinematográfico chamado de “As Melhores Comédias Românticas Já Feitas” que eu, então, também foi impactada pela famosa frase “30 é a idade do sucesso” (ou no inglês, “thirty and flirty and thriving“).

30 é a idade do sucesso ~

O trecho é do filme “De Repente 30“, romance protagonizado pela Jennifer Garner e pelo Mark Ruffalo. No longa, Jenna Rink é uma garota de 13 anos que está vivendo aquele inferno da pré-adolescência e a única amizade genuína que tem em sua vida é com Matt, seu vizinho. Em seu 13º aniversário, ela faz um pedido: ter 30 anos, porque em todas as revistas que lia diziam que trinta é a idade do sucesso. O pedido se torna realidade e, no dia seguinte, Jenna acorda no corpo perfeito da Jennifer Garner e vê que se tornou tudo o que sempre quis ser – mas até a página dois.

A frase grudou aí também? Porque aqui, desde quando vi esse filme e me senti dolorosamente representada pela protagonista colocando papel higiênico para fingir que tinha seios grandes, grudou. “30 é a idade do sucesso“. E que medo que eu tinha dos trinta.

Não é por acaso. Existe sim (!) toda uma mitologia acerca dos 30 anos. E os motivos são variados. Um pouco é pela baixa expectativa de vida que tínhamos há umas boas decadas atrás, onde de fato os 30 eram o auge da nossa experiência terrena; também temos o famoso romance do Honoré de Balzac, “A Mulher de Trinta Anos“, onde ao descrever as lamúrias e insatisfações de Julie d’Aiglemont, o autor acabou cunhando o termo “balzaquiana” para toda mulher que completa três décadas de vida. Também existe o lance biológico da coisa, onde de fato, a mulher aos 30 está no seu auge para procriar e, logo depois disso, ela “perde a validade” (não que eu acredite nisso, pelo amor de deus!).

Eu sempre pensei muito sobre quando eu completaria a Famosa Idade™️. Tanto que quando eu me sentia sensível ou sem respostas para a vida, eu escrevia cartas para a Michele do futuro. Separei um trecho de uma que escrevi aos 23, em pleno inferno astral (o período de um mês antes do seu aniversário que alguns astrólogos dizem que existe, outros falam que não mas que, para mim, sempre significa extrema sensibilidade e reconsiderações sobre toda a minha vida). 

Esse gif da Gretchen é um dos meus favoritos da internet, preciso dizer
"Chegamos lá? Mas afinal... Descobrimos o que é o lá? Você está bem sucedida? (apesar de hoje eu não saber o que isso significa, você sabe? Estamos?) Você tá pensando em ter filhos? Outra coisa que gostaria de saber é se você continua meio Holden Caulfield, porque assim, você tá nessa desde os seus 17 anos e, espero, profundamente, que essa síndrome de eterna questionadora insatisfeita tenha te abandonado aos 33! Sabe, é muito chato você querer tudo e não se satisfazer com nada. Na verdade, tenho uma pergunta mais direta: hoje você sabe exatamente o que quer? Está perto de conquistar isso? Por favor, me diga que simmm! Não aguento mais ter esse bicho no peito que nos impede de ser 100% feliz porque você não sabe o que quer ou não aceita que finalmente cresceu e que crescer é um saco mesmo." 

Você até pode ler essa carta na íntegra aqui.

A única resposta possível da Michele dos (quase) 30: k k k k krying

Hoje eu não só não tenho respostas para nenhuma dessas perguntas, como tenho várias outras questões de tirar o sono. O que aprendo é que, na verdade, os 30 significam muitas outras primeiras vezes, mas sob uma ótica muito mais realista e menos romântica. Hoje, minha relação com trabalho é bem diferente da que eu idealizava aos 23; vou ser mãe sem planejar, mas extremamente feliz com esse bonito incidente; estou contestando muitas coisas que li ao decorrer da vida, que vão desde religião até relacionamento amoroso; tenho uma relação completamente diferente com dinheiro; entendo a importância de ser política, enfim. Enfim, zero respostas, milhões de novas perguntas. ¯\_(ツ)_/¯

O irônico é que ao mesmo tempo em que essa imensidão de novas questões deveriam me apavorar, elas me confortam, afinal, nada mais confortante em saber que a vida não é um caderno de questões de vestibular com respostas certas ou erradas. Percebi que a vida tá mais pra uma dissertação filosófica com questões de respostas subjtivas, onde cada um pode responder algo completamente diferente do outro, mas ambas as respostas estarão corretas, sabe?

Acho que se com 20 a gente idealiza, com 30 a gente realiza que viver é meter o freestyle. É fazer o melhor com o que se tem.

Sem receita, sem certo ou errado, mas um eterno “vambora fazendo”.

Inês Brasil "num podemos perder a esperança, né não?"
PORQUE DEUS DISSE: FAÇA POR ONDE E EU TE AJUDAREI 🙏🏻

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